quarta-feira, 25 de maio de 2011

Projeto: A constituição do campo da pedagogia social no Brasil, de Emerson Zoppei

PROJETO DE PESQUISA

A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO DA PEDAGOGIA SOCIAL NO BRASIL

Projeto apresentado à disciplina Metodologia de Pesquisa do Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

Emerson Zoppei –

Nível: Doutorado (2º. Sem/2010)

Orientador: Prof. Dr. Afrânio Catani

Junho/2011

RESUMO

Este projeto pretende investigar a constituição do campo da educação não-escolar no Brasil a partir do referencial teórico de Pierre Bourdieu, principalmente, as noções de campo, habitus e capital com o objetivo de identificar os agentes e as posições que esses ocupam, as lutas que travam nesse campo – definições, bibliografia etc, quais as questões e os objetos que estão em disputa, qual o grau de autonomia do campo frente ao campo da educação e do mundo social, e mais, ocupando as posições no campo, como os agentes produzem e reproduzem o próprio campo.

O material utilizado será as trajetórias profissionais de pesquisadores da área a fim de que possa delimitar aqueles mais representativos. Toda a publicação dos anais publicados nos I, II e III Congresso Internacional de Pedagogia Social e o banco de dados dos participantes e consulta bibliográfica espanhola sobre como se deu o processo de constituição e consolidação do campo da educação social nesse país para se possa compreender a realidade brasileira.

Palavras chave: Campo, Habitus, educação não-escolar, educação social, educação não-formal.

INTRODUÇÃO

Outras formas de educação, como por exemplo, a educação informal[1] e não-formal[2], sempre existiram, elas não são uma invenção recente. No entanto, as expressões educação não-formal e educação informal passaram, com as publicações das obras “The world educational crisis” e “Attacking rural poverty: how no-formal education can help”, escritas por Combs (1968) e Combs e Ahmed (1974)[3] respectivamente, a ser legitimadas, principalmente, pela incorporação dessas definições à linguagem pedagógica nos anos 60 e 70 e popularizadas para outros âmbitos ditos não acadêmicos (ONU, UNESCO, ONGs, Estado, mídia), expandindo-se no cenário mundial, impulsionadas, principalmente, pelas novas demandas sociais, econômicas, tecnológicas (GOHN, 2001) e (LARANJEIRA e TEIXEIRA, 2008).

Para justificar essas novas demandas por essa educação não-escolar[4], discursos foram construídos no intuito de legitimá-los. Alguns deles contestaram a educação escolar[5], outros, tentaram criar e legitimar conceitos numa linguagem pedagógica própria do universo não-escolar. Desde então, estes conceitos foram-se ampliando e ressignificando e já fazem parte da linguagem pedagógica[6].

Nos anos 60 e 70 houve uma intensa disseminação dessas práticas de educação não-escolares no Brasil (naquele momento, utilizava-se o termo “extra-escolar”). Esse universo foi objeto de pesquisa[7]. Realizada com o apoio financeiro do MEC/INEP, a pesquisa cria uma tipologia da educação extra-escolar, define os principais conceitos e permite ter uma dimensão geral da realidade dessas práticas no Brasil. Essa é a única publicação disponível que abarcou de forma abrangente esse rico universo de práticas não-escolares num determinado momento histórico.

Nos anos 80 e meado dos anos 90 poucos estudos sobre essa temática foram produzidos no campo da Educação. Entretanto, nos últimos 15 anos observa-se um aumento considerável quando comparado com a década anterior. No entanto, essas publicações tendem somente a descrever essas práticas. Pouca atenção foi dada a uma análise mais geral, de conjunto e histórica[8]. Um marco nesse período foi o livro de Gohn (1999) intitulado “Educação não-formal e cultura política”, no qual a autora se utiliza da categoria “educação não-formal” para explicar e descrever o processo de aprendizagem e a construção de saberes durante suas pesquisas no interior dos Movimentos Sociais. Esse texto teve grandes repercussões no meio acadêmico e Gohn torna-se uma referência obrigatória nos estudos posteriores, principalmente, para consolidar o termo “educação não-formal” em face a outros universos educativos, por exemplo, educação formal (compreendida como educação escolar) e educação informal.

Com o passar do tempo, essas práticas ganham maior visibilidade tanto no interior da academia, nos órgãos públicos e na mídia. Esses debates se revelam, embora incipiente, na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996. No primeiro artigo, a LDB versa sobre o conceito de educação:

Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.

Reconhece-se oficialmente outros âmbitos da educação, ultrapassando ou rompendo com a identificação quase unívoca e imediata entre “educação” e “escolarização” ou educação escolar. Saviani (2003) afirma que essa abrangência “constitui um ponto de partida para se corrigir a fragmentação, assim como os unilateralismos que têm marcado a situação educacional em nosso país” (p.201-202).

Entretanto, nesse mesmo artigo da LDB, o inciso 1º restringe o âmbito do que será legislado, voltando exclusivamente à educação escolar[9]. A nova LDB somente admite a existência de outras formas de se educar, porém, não as regulamenta, muito menos pensa numa articulação, ou até mesmo, numa complementaridade entre aquelas “outras formas de se educar” e a educação formal (ARANTES, 2008, p.8). Ou seja, a educação formal está sendo construída alheia ou indiferente à educação não-formal.

Tudo isso configura um cenário não muito favorável ao universo das práticas de educação não-escolar, principalmente, para que ela possa se fazer ver e ser vista, e assim, serem discutidas e publicizadas na sua complexidade.

Recentemente esse quadro vem se alterando: aparecimento de pesquisadores voltados a essa temática; criação de grupos de pesquisa cadastrados no CNPq; cursos de pós-graduação dirigidos a este universo educativo; criação de GT de Pedagogia Social em congressos; criação de convênios entre universidades, grupos de pesquisa e pesquisadores brasileiros e estrangeiros, criação de cursos de especialização e Mestrado Profissionalizante nas Universidades privadas, propostas de criação de cursos de nível superior de Pedagogia Social e nível médio de educação social; maior visibilidade social dessas práticas a partir da atuação das ONGs.

Impulsionado por esse novo cenário, realizou-se o I, II e III Congresso Internacional de Pedagogia Social na FE/USP nos anos de 2006, 2008 e 2010. Participaram pesquisadores estrangeiros da Alemanha, Espanha, Cuba, Argentina e Uruguai[10], trazendo discussões que mostravam as especificidades da Pedagogia Social em seus países,: as linhas de pesquisa, a formação do pedagogo social no ensino superior etc. Enquanto os pesquisadores brasileiros se esforçaram para delinear o desenvolvimento da “Pedagogia Social” no Brasil.

Desta forma, redefine-se o debate e as pesquisas no Brasil a partir da introdução de novas questões, tais como, o delineamento de um aporte teórico de sustentação dessas práticas, a discussão de metodologias, a definição dos âmbitos ou dos domínios dessas práticas educativas, a preocupação com a formação do educador e pedagogo social, a criação de linhas de pesquisa.

Este trabalho se inserir justamente nesse debate e pretende captar esse momento de constituição do campo[11] da educação não-escolar, que ainda não está consolidado, hipótese deste trabalho, mas que é possível vê-lo se delineando ou em construção, ou seja, formando os espaços sociais nos quais os agentes pretendem ocupar ou já ocupam, as lutas que travam por legitimidade e reconhecimento dos objetos de estudos, suas estratégias nesse jogo social e o habitus daí incorporado.

JUSTIFICATIVA

“Que mundo social é esse que vem se perfilando nas dobras das mutações em curso nas últimas décadas?”

(TELLES, 2007)

Ao colocar esta questão, Telles (2007) se interroga sobre a possibilidade de se construir critérios que nos permitam compreender um mundo que vertiginosamente se altera, acelerado por uma intensa financeirização da economia, autonomização dos mercados e revolução tecnológica. Subjaz a esta pergunta, um marco claro: os impactos da política neoliberal sobre o espaço social e político brasileiro desde os anos 1990 - o chamado “desmanche neoliberal”, como diria Schwarz. Esse “desmanche” caracteriza-se pela “destruição de direitos, das transformações do mercado falseadas como “modernas”, do descaso diante da questão do social e do desemprego, do rebaixamento do estatuto do trabalho e da despolitização dos conflitos de classe e dos movimentos sociais autônomos, do aprofundamento da desigualdade, da implantação nas cidades da desmedida e da barbárie da indiferença em relação à miséria, da violência como mediadora da questão agrária, da dilapidação do patrimônio público sobre a desmesura ganância das corporações, da introdução da filantropia e da responsabilidade empresarial como substituição das políticas públicas, enfim, com a desregulamentação acelerada das relações sociais, dos bens e dos espaços públicos” (RIZEK e PAOLI, 2007, p.9, grifos meus).

Muitos autores concordam em dizer que dos anos 1960 a 1990[12], o Brasil passou por um intenso processo de invenção política[13]. Nesse terreno, a promessa da ampliação do espaço público democrático era vivenciada como algo do possível com a ação dos movimentos sociais dos mais diversos em defesa do direito a ter direitos. Com a entrada das políticas neoliberais, todo um movimento de deslegitimação da política do dissenso foi impetrado. O Brasil, como diria Chico de Oliveira (2007), passou a viver a era da indeterminação.

A passagem de um registro a outro, ou seja, da invenção da política a era da indeterminação – marcados pelas perspectivas e promessas diferentes de mundo, tem como marco referencial os anos 1990. Coincidentemente, este também é o marco de mudança do campo da educação não-escolar. Conforme alguns autores,

“... [nas] décadas de 60 a 70, houve no Brasil o surgimento de experiências educacionais gestadas pelos movimentos sociais de esquerda, oferecendo um processo de autoconhecimento e conscientização política para muitos grupos” (GARCIA, 2007, p.39).

“o grande destaque que a educação não-formal passou a ter nos anos 90 decorre das mudanças na economia, na sociedade e no mundo do trabalho ... [d]os apelos da mídia ... [das] agências internacionais, como a ONU e a UNESCO, bem como [de] alguns estudiosos” (GOHN, 2001, p.92).

Acrescente a esta última citação, “a introdução da filantropia e da responsabilidade empresarial como substituição das políticas públicas”, conforme foi dito por Rizek e Paoli, anteriormente.

Para compreender e historicizar o campo da educação não-escolar, faz-se necessário traçar, de forma breve, um panorama das mudanças do campo durante esse período, no qual, outrora, alguns agentes e instituições relevantes que tinham determinadas práticas passaram a não ter mais importância, pois estão numa posição dominada, ou a relevância que tinham se extinguiu no momento seguinte. E também, novos agentes e instituições apareceram neste espaço ou também aqueles que, anteriormente, não tinham expressividade, passaram a ter.

Pois bem. Até os anos 1980, as práticas de educação não-escolar no Brasil estavam fortemente conectadas com as experiências de alfabetização de adultos, principalmente, a partir das experiências freirianas e dos movimentos sociais. Nesses anos, houve um intenso processo de organização social em sindicatos e em associações tanto para protestar contra o regime político vigente quanto para reivindicar direitos (GOHN, 1999). Outros atores participaram também deste cenário - as “ONGs cidadãs e militantes”[14], conforme Gohn (2001).

Estas ONGs cidadãs e militantes lutavam em duas linhas de frente: 1º.. contra o regime político em torno das questões das torturas cometidas e dos presos políticos na ditadura; 2º. na exigência de melhores condições mínimas de sobrevivência[15].

Nos anos 90, com a abertura do Leste europeu, migrou-se o financiamento que era dirigido a essas ONGs para aqueles países no intuito de investir nos processos de redemocratização.

As ONGs entraram numa crise, pois não eram auto-sustentáveis e dependiam quase que exclusivamente desses apoios e financiamentos[16].

As ONGs alteraram seus procedimentos buscando a auto-suficiência, conseqüentemente, mudaram-se as suas perspectivas. As ONGs que atrelavam suas atividades à militância política, passaram a centralizar suas ações no setor da produção[17] e mais, elas passaram a investir fortemente na qualificação do quadro de pessoal[18] – desde a elaboração de projetos a captação de recursos. Para suprir essa última necessidade, inúmeras instituições educacionais de nível superior passaram a oferece cursos de especialização nas áreas de elaboração e avaliação de projetos, capitação de recursos, gestão do terceiro setor.

“De acordo com Maria Célia Paoli, (...) as ONGs aumentam em número em um momento de crise econômica e têm como um de seus diferenciais a competência técnica, pois, para sobreviverem no “mercado das ONGs” e permanecerem como instituição, necessitam competir cada qual na sua especificidade, principalmente, por sua capacidade de produzir projetos como fonte principal de financiamento. Nesse processo de constituição de identidade tão diverso existente no grupo das ONGs, há por vezes ambivalências, e por outras vezes ambigüidades, pois as ONGs, ao mesmo tempo em que necessitam garantir sua sobrevivência, necessitam defender e fazer valer sua atuação e projeto político. Essas duas faces podem ser conflitantes” (GARCIA, 2007, p.47)..

Emergiram nos anos 90 novos agentes vinculados ao que é chamado de Terceiro Setor, por exemplo, a filantropia empresarial, as fundações – estas últimas mantidas por um percentual do faturamento das empresas -, organizações não-governamentais. Estes agentes aparecem no cenário como promessa de renovação do espaço público (FALCONER, 1999) e passaram a ter relevância no Brasil com as inúmeras reformas feitas no governo Fernando Henrique Cardoso, capitaneadas pelo então ministro da Administração Federal, Bresser Pereira, que implementou a versão brasileira da terceira via[19], traduzida na noção público não-estatal (PAOLI, 2001).

Oliveira (2007) e outros[20] ao analisar as transformações sofridas pelas ONGs dos anos 70-80 aos anos 90, orquestrado, como vimos anteriormente, na passagem do registro da invenção da política para a era da indeterminação, comenta:

“(...) essas organizações se transformaram em entidades supletivas das insuficiências do aparelho estatal e estão no interior de um complexo processo de disputa do sentido do que quer dizer “social” e “política”. Continua ele, “para além da tomada de consciência sobre as desigualdades abissais, o que é formidável e inovador na experiência brasileira, escondem-se, contra toda a perspectiva ética dos envolvidos, que é geralmente nobre, nas dobras da crítica ao Estado “mau gerente” a privatização das políticas sociais, a desuniversalização, a volta ao assistencialismo ou, na perspectiva da Escola de Serviço Social da PUC/SP, a ‘filantropização da pobreza’” (p.41-42).

Esse deslize semântico do que quer dizer “social” e “político”, também ocorreu com a idéia de cidadania. De substantiva, passou a ser utilizada como algo que possa adjetivar alguma coisa, como por exemplo, “ginásio cidadão”, “esporte cidadão”. Isso despotencializa a própria dimensão crítica do conceito para lidar com a complexidade empírica dos conflitos reais próprios do universo do direito, das iniqüidades e das exclusões. Por isso, pode-se perceber que “do surgimento relativamente recente de uma assim chamada sociedade civil que, através primeiro de movimentos sociais autônomos e politizados e depois de organizações não-governamentais profissionalizadas, deslocou o ativismo político pela cidadania e justiça social para o ativismo civil voltado à solidariedade social. Se o caminho aberto pelos movimentos sociais era fortemente politizado e implicava na demanda direta da população carente organizada por bens públicos, o caminho das ONGs opta por representar as demandas populares por soluções pragmáticas tecnicamente formuladas, com os governos, dispensando a base ampliada da participação popular” (PAOLI, 2001, p. 201)[21].

Posto isto, construiu-se e se intensificou ao longo desses anos, parcerias com as esferas públicas e privadas brasileiras e internacionais, diversificando as formas de se captar recursos e, conseqüentemente, redefinindo o papel do Estado na área social. Leis foram criadas nas instâncias federal, estadual e municipal regulamentando a atuação dessas instituições.

Ao mesmo tempo, uma intensa publicização dessas práticas nas mídias impressa, televisiva e radiofônica destacava os impactos na vida dos “beneficiários” ou “publico alvo” e, ao mesmo tempo, o papel fundamental das instituições na diminuição os índices de violência, das mazelas sociais.

Concomitante a isto, inicia-se um processo de premiações concedidas por Institutos renomados que certificam as melhores práticas e/ou as melhores instituições que trabalham no social (SILVA, 2006), afetando diretamente o mover-se desses agentes e instituições.

As universidades acabam incorporando essa temática em seus estudos[22]. A partir de levantando bibliográfico parcial feito na Faculdade de Educação/USP[23], observa-se um aumentou considerável de publicações quando comparado com as produzidas antes de 1990. Entretanto, esse aumento não traduz em reconhecimento e legitimidade no interior campo da educação. As questões que envolvem a educação não-escolar ainda é um objeto desprestigiado. Basta observar o número baixíssimo de trabalhos apresentados na ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação) na última década, concentrando, principalmente, nos GT - Movimentos Sociais, Sujeitos e Processos Educativos e Educação Popular.

Analisando a produção disponível, a maioria delas é feita por educadores sociais ou militantes na área da infância e juventude que buscam a universidade para tentar sistematizar suas práticas, porém sem muito sucesso, posto que não há um referencial teórico consistente que dê suporte para refletir a pratica. Isso explica o uso recorrente e excessivo de autores que pensam exclusivamente o universo da educação escolar[24], e mais, a preocupação excessiva em descrever as práticas educativas desenvolvidas nos abrigos, na educação de rua, nas instituições sociais que trabalham com adolescentes em conflito com a lei, nos projetos sociais.

Outra temática que se destaca nessas produções é as condições que envolvem o educador social: desde a precarização do trabalho, passando pelos direitos trabalhistas até a inexistência de formação específica.

Recentemente, os livros de Gohn (2010) e Silva (2010) tentam reorganizar as discussões. O livro “Educação não-formal e o educador social: atuação no desenvolvimento de projetos sociais”, publicado em 2010, Gohn tenta sistematizar os conceitos e a produção da área e discutas algumas questões concernentes à formação do educador social. O livro “Pedagogia Social”, organizador por Roberto da Silva, é uma coletânea de artigos dos I, II e III Congressos Internacionais de Pedagogia Social realizados na FE/USPS, tem o objetivo de difundir, como proposta para o Brasil, a “definição operacional das categorias e variáveis que são centrais na concepção de pedagogia social” (p.9)

De certa forma, é possível dizer que esses livros representam as disputas no interior desse campo por busca de legitimidade (campo do poder). Gohn defende a noção de Educação não-formal, enquanto para Silva “soa profundamente incômoda a noção de Educação não-formal” (p.10). E mais, “parece-nos que as ricas e diversificadas práticas educativas que se convencionou arrolar sobre o rótulo de Educação não-formal foram despidas de suas conotações históricas, políticas e ideológicas” (p.10). Por isso Silva defende a criação da Pedagogia Social, compreendida como a Teoria Geral da Educação Social, para compreender as práticas de educação social, educação popular e educação comunitária. Entretanto, essa visão é contestada por Gohn, que diz: “Recentemente uma nova polêmica surgiu contrapondo educação não-formal à educação social, parte da pedagogia social” (negritos da autora, p.30). Continua ela, “No Brasil, na atualidade, há uma ânsia em dar um estatuto científico à pedagogia social, e construí-la como um campo de conhecimento e práticas educativas diferente da pedagogia escolar. A pedagogia social é alçada a uma Teoria Geral, visando formar um profissional específico: o pedagogo social. [...] Os novos cursos formariam os Pedagogos Sociais, e poderiam desenvolver habilitações específicas, assim como cursos de especialização em Pedagogia Social para outros profissionais interessados [...] . A sustentação dessas posições não se faz pelo embate com o tipo de formação dada pelas escolas atuais [...]. Tal abordagem autoproclamam-se como científica, ou seja, é dita e tida como científica porque nomeada como tal, dentro de uma Teoria Geral da Educação Social, na qual também não se fornecem muitos elementos” (p.31-2).

E mais, Gohn havia participado de um dos congressos, porém negou a inclusão do seu artigo nessa coletânea por discordar das posições dos organizadores do livro.

Um e outro defendem um determinado ponto de vista e disputam uma determinada posição. É interessante que ambos apresentam seus trunfos, ou seja, seus capitais acumulados, e estão dispostos a “travar uma luta” em torno do que será pertencente ou não a esse universo, uma espécie de jogo, no qual ambos sabem as regras e as respeitam.

A hipótese deste trabalho é que todo esse cenário descrito anteriormente permite perceber que há um processo de constituição do campo da Educação não-escolar no Brasil, porém ainda não está consolidado, pois desde a descrição do mundo social, passando pelo funcionamento do campo da educação até chegar nas ações dos pesquisadores e da produção realizada na área da educação social verifica-se que o campo funciona ainda de forma heterônoma. E para corroborar ainda mais essa hipótese, quase inexiste um debate de fronteiras e delimitações deste campo com as outras áreas que tem o seu lócus identitário no campo socioassistencial, por exemplo, o serviço social e a psicologia social.

E como não há na literatura disponível uma pesquisa que procurasse delinear a constituição desse campo, e mais, como um trabalho dessa natureza ajudará também nesse processo de consolidação que se justifica esse projeto.

OBJETIVO

Este projeto pretende investigar a constituição do campo da educação não-escolar no Brasil a partir do referencial teórico de Pierre Bourdieu, principalmente, as noções de campo, habitus e capital com o objetivo de identificar os agentes e as posições que esses ocupam, as lutas que travam nesse campo – definições, bibliografia etc, quais as questões e os objetos que estão em disputa, qual o seu grau de autonomia frente ao campo da educação e do mundo social, e mais, ocupando as posições nesse espaço, como os agentes produzem e reproduzem o próprio campo.

MATERIAL E MÉTODOS

1. Coleta de informações sobre as trajetórias profissionais de pesquisadores.

2. Entrevistas com os principais pesquisadores da área.

3. Os anais publicados nos I, II e III Congresso Internacional de Pedagogia Social e o banco de dados dos participantes

4. Consulta de bibliografia espanhola sobre como se deu o processo de constituição e consolidação do campo da educação social em seu país a fim de que se possa comparar e pensar a realidade brasileira.

Todo este material será analisado a partir das teorias de P. Bourdieu e de outros autores relevantes da área, principalmente, com o objetivo de: em relação aos agentes, “desmontar ‘o sistema social constituído por esquemas incorporados de julgamento e de ação (habitus) que comanda sua conduta e representações e orienta suas estratégias’” e, assim, historicizar o campo da educação não-escolar “nos quais os indivíduos socializados ‘investem seus desejos e suas energias e abandonam-se a essa corrida sem fim pelo reconhecimento que é a existência social’” (CATANI, 2008: p.327)[25].

Compreendendo a noção de campo como um espaço onde os agentes são distribuídos a “o universo no qual estão inseridos os agentes e as instituições que produzem, reproduzem ou difundem a arte, a literatura ou a ciência”(Bourdieu, 1984 : 20)[26], é possível constituir o campo da pedagogia social. Faz-se necessário, assim, investigar quem são os agentes e as instituições menos para catalogá-los, mas para inseri-los neste espaço, construindo as posições que estes ocupam[27] e mais, como esses agentes, ocupando suas respectivas posições no campo, produzem e reproduzem o próprio campo.

Para Bourdieu, não há possibilidade de se pensar a partir da noção de campo sem pensá-lo relacionalmente. E também, “só se pode esclarecer a dinâmica de um campo pela análise genética de sua constituição e das ‘tensões entre as posições que o constituem, em especial, o campo do poder” (CATANI, 2008, p.321). “É a estrutura das relações objetivas entre os agentes que determina o que eles podem ou não podem fazer. Ou, mais precisamente, é a posição que eles ocupam nessa estrutura que determina ou orienta ..., suas tomadas de posição”(BOURDIEU, 2004, p.23).

Bourdieu esclarece que esta estrutura é determinada pela distribuição de capital específico[28] num determinado momento e reconhecido por todos os agentes do campo.

Diante disso, é preciso investigar qual(is) tipo(s) de capital que faz(em) parte do campo da educação não-formal e depois determinar o quanto cada agente acumula deste capital. Este peso será imprescindível para determinar a posição que cada um ocupa no espaço, e assim, conhecer o quanto cada agente pode influenciar nas tomadas de posição neste espaço, por isso o autor diz que um campo não se orienta totalmente ao acaso, há lutas em torno dessas estruturas porque os agentes não estão passivos, eles agem em conformidade com as forças do campo (BOURDIEU, 2004). Os campos têm o que Bourdieu (1983) nomeia de habitus, um conjunto de disposições adquiridas pela aprendizagem implícita ou explícita que funciona como um sistema de esquemas geradores de estratégias para a compreensão e explicação do mundo social.

Conforme Chartier diz,, “o funcionamento de um habitus depende não apenas de sua estrutura intrínseca, mas igualmente do campo no qual ele é exercido. Assim, se o campo muda, o mesmo habitus produz efeitos diferentes” (CHARTIER APUD CATANI, 2008, p. 324)[29]. Isto mostra como os conceitos de campo e habitus estão intimamente relacionados na constituição das práticas.

Com isso, percebe-se que os agentes e as instituições lutam a partir de regras próprias ao campo que participam (podendo lutar até mesmo em torno dessas regras), entretanto, por estarem em posições diferentes dentro desse espaço, porque os agentes não possuem as mesmas quantidades de capital específico acumulado, a luta entre esses agentes se trava de forma desigual, as possibilidades, as chances dos agentes de obterem sucesso na apropriação dos bens em disputa são bem variados.

PLANO DE TRABALHO E CRONOGRAMA DE SUA EXECUÇÃO

1. Levantamento da bibliografia disponível sobre o tema

2. Leitura e fichamento da bibliografia consultada brasileira e internacional

3. Cumprimento dos créditos de disciplinas obrigatórias;

4. Coleta e análise dos 3 Congressos Internacionais de Pedagogia Social

5. Coleta do Curriculum Lattes dos principais pesquisadores brasileiros na área

6. Elaboração de um quadro com informações objetivas e mensuráveis (conjunto de propriedades)

7. Preparação de um roteiro de entrevista com autores significativos

8. Entrevistas com três autores que têm uma produção significativa nessa área.

9. Análise das entrevistas

10. Aplicação de uma pesquisa qualitativo e quantitativo em duas instituições de ensino superior que desenvolvem pesquisas na área de educação não-escolar.

11. Análise dos dados

12. Qualificação

13. Elaboração da tese

Atividades

1º ano

2º ano

3º ano

4º ano

1





2





3





4





5





6





7





8





9





10





11





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13





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] Entende-se por Educação Informal: “... toda a gama de aprendizagens que realizamos (tanto no papel de ensinantes como de aprendizes), e que acontece sem que haja um planejamento específico e,muitas vezes, sem que nos demos conta (TRILLA, 1996). Acontece ao longo da vida, constitui um processo permanente e contínuo e não previamente organizado (AFONSO, 1989)” (PARK, 2007, p.127). Ela não será objeto deste estudo.

[2] Educação não-formal “é aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianas” (Gohn, 2006, p.28).

[3] Na primeira publicação, Combs (1968) utiliza a expressão “educacional não escolar” para designar todas as outras práticas não escolares. Isto se mostrou não funcional, posto que agregava práticas díspares, o que impossibilitava circunscrever o próprio objeto de estudo. Será na obra posterior que Combs e Ahmed (1974) precisaram os conceitos, tipificando o universo da educação em: formal, não-formal e informal (TRILLA, 2008).

[4] “Educação não-escolar” inclui o universo das práticas das educações não-formal, extra-escolar, educação social e informal. Embora haja diferenciações, o sentido atribuído aqui é reunir o universo dessas práticas que não fazem parte da educação escolar. Poderia também utilizar “educação não-formal” ou “educação social”, termos mais conhecidos no universo acadêmico, porém esses próprios termos são objetos de disputas, logo, escolher um em detrimento do outro, significaria filiar a uma perspectiva. A educação informal não será objeto de reflexão deste projeto.

[5] Em Silva (2006) há um panorama de como se deu essa discussão, apontando, inclusive, que a própria visibilidade da educação não-formal contribuiu para as muitas críticas feitas ao universo da educação formal - nesse caso, para a educação escolar.

[6] No Brasil, publicou-se recentemente um conjunto de verbetes da educação não-formal em (PARK, FERNANDES e CARNICEL, 2008) . E também consta no Thesaurus Brasileiro da Educação.

[7] Ver a obra TIPOLOGIA DA EDUCAÇÃO EXTRA-ESCOLAR Brasília: INEP, 1980. 116p. (Estudos e pesquisas ; 5)). Durante essa pesquisa, houve um intenso debate sobre a educação extra-escolar, principalmente, com as discussões do Seminário sobre o Estudo do Extra-Escolar no Brasil, realizado no Rio de Janeiro em 1976, que teve a assessoria de Pierre Furter e a participação de muitos outros pesquisadores renomados e algumas instituições. Para maiores informações ver Fórum Educacional, 1977.

[8] Ver (Zoppei, 2004); (Fernandes, 2001); (Garcia, 2001); (Cunha, 2001); (Giglio & Vargas, 2005); (Reis, 2000).

[9] Saviani (2003) argumenta que a restrição é procedente, posto que a educação escolar “emergiu na modernidade como a forma principal e dominante de educação, erigindo-se em ponto de referência e critério para se aferir as demais formas de educar” (p 202). Daí a idéia de inFORMAL e não-FORMAL.

[10] A Pedagogia Social está plenamente desenvolvida, institucionalizada, com um campo próprio constituído e consolidado nesses países.

[11] A noção de campo de Pierre Bourdieu.

[12] Ver (Sader, 1988); (Kowarick, 1994); (Doimo, 1995).

[13] “Política no sentido de Rancière é a reclamação da parte dos que não têm parte, e por isso se constitui em dissenso. Nessa acepção, os que fazem política distinguem-se por pautar os movimentos do outro, do adversário, por impor-lhe minimamente uma agenda de questões sobre as quais e em torno das quais se desenrola o conflito. ... A força de uma invenção se expressa na capacidade de manter o adversário nos limites do campo criado pela proposta/resposta, e isso confere estabilidade ao campo político, mantendo a pauta e a agenda das questões” (Oliveira, 2007 : p.15-16). Ver (Oliveira e Rizek, 2007); (Oliveira e Paoli, 1999).

[14] “No Brasil, nos anos 70-80, as ONGs cidadãs e militantes estiveram por detrás da maioria dos movimentos sociais populares urbanos que delinearam um cenário de participação na sociedade civil, trazendo para a cena pública novos personagens ...” (GOHN, 2001, p.76).

[15] Graciani (1999), pesquisadora ligada a diversas lutas de movimentos sociais, sistematiza uma experiência de pedagogia social de rua, enraizada na perspectiva freiriana. Essa experiência nasce de setores da sociedade civil mobilizados, na década de 80, contra os rumos e perspectivas das crianças e jovens de rua na cidade São Paulo.

[16] “A escassez de recursos das agências de cooperação internacional e a mudança interna em seus critérios e diretrizes – de assessoria interna para geradora de fundos financeiros – criou um cenário que levou à necessidade de elas [ONGs] gerarem recursos próprios e lutarem pelo acesso aos fundos públicos” (GOHN, 2001, p.77).

[17] . “o movimento dos seringueiros ... lutará não apenas por seus direitos ou contra a opressão dos grandes latifundiários ... . Ele lutará basicamente para vender seus produtos em mercados mais competitivos” (GOHN, 2001, p.77)

[18] “Algumas ONGs, como o Projeto Axé, da Bahia, declarou formalmente que a militância anterior é um problema para a entidade, e foi um equívoco, no início do trabalho deles, buscar profissionais com esta trajetória”. (GOHN, 2001, p.78).

[19] Ver (GIDDENS, 2001) para o conceito de terceira via.

[20] Ver também (YASBEK, 2000); (PAOLI, 2007); (TELLES, 2007); (LANDIM, 1993);

[21] Paoli (2007) discuti esses mundos gerenciados - campo das gestão das relações sociais e políticas, e como isto atravessa o universo das ONGs.

[22] Vale ressaltar que há um intenso intercâmbio dessa produção com a que é feita em outros países. Destaca-se a produção dos pesquisadores espanhóis, que foram um dos que preconizaram a terminologia em voga atualmente. Um destaque para o pesquisador espanhol, Jaume Trilla, referência dos pesquisadores brasileiros quando discutem conceitualmente a educação não-formal e os âmbitos de atuação. Ver (TRILLA, 1985 ; 1986 ; 1993 ; 2003).

[23] Consultando a base de dados do INEP e da CAPES, chegou-se a mesma conclusão. Utilizou os descritores “educação não-formal”, “educação social”, “educação extra-escolar”.

[24] É comum ler numa mesma página as expressões “Educando”, “aluno”, “educador” e “professor” . Isso mostra que não há ainda um vocabulário constituído para descrever e explicar o que eles vivenciam na prática.

[25] “Wacquant lembra, mais uma vez, que as práticas constituídas nesse processo não decorrem apenas de intenções subjetivas dos agentes nem resultam diretamente de imposições estruturais objetivas. Nascem ‘nas turbulências da confluência’ entre elas ou entre os ‘dois modos de existência do social’ que são o habitus e o campo, a ‘história objetivada nas coisas’ e a ‘história encarnada nos corpos’”. (CATANI, 2008: p.327).

[26] Daí a existência dos campos artístico, literário e científico.

[27] “Os agentes criam o espaço, e o espaço só existe (de alguma maneira) pelos agentes e pelas relações objetivas entre os agentes que aí se encontram” (BOURDIEU, 2004, p.24).

[28] Ver (Bordieu 1996; 2007)

[29] Para ilustrar tudo o que foi dito sobre as noções de campo e habitus, observe o exemplo dado por Bourdieu (2004): “Uma grande empresa deforma todo o espaço econômico conferindo-lhe uma certa estrutura. No campo científico, Einstein, tal como uma grande empresa, deformou todo o espaço em torno de si. Essa metáfora “einsteiniana”a propósito do próprio Einstein significa que não há físico, pequeno ou grande, em Brioude ou Havard que (independentemente de qualquer contato físico, de qualquer interação) não tenha sido tocado, perturbado, marginalizado pela intervenção de Einstein, tanto quanto um grande estabelecimento que, ao baixar seus preços, lança fora do espaço econômico toda uma população de pequenos empresários”(p.23).

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