Denise Nalini
O papel da apreciação da paisagem na produção de desenhos com crianças de seis a sete anos – Uma proposta de investigação didática
Resumo :
O objetivo dessa investigação é identificar quais os desafios que as crianças de seis a sete anos enfrentam na fatura dos desenhos de paisagens e analisar o papel da apreciação para o avanço desse tipo de desenho. Partimos da concepção de desenho como possibilidade vinculada as experiências vividas, a força da cultura visual e as situações de aprendizagem oferecidas a criança, em outras palavras, desenho cultivado segundo Rosa Iavelberg. Esta investigação se remete aos estudos e teorias que tratam de uma gênese do processo de aprendizagem do desenho, as bases epistemológicas estão marcadas por uma orientação construtivista, que utiliza a epistemologia genética de Piaget e a escola sócio-histórica de Vygostsky. É fundamentada nos estudos de Piaget quanto aos processos de desenvolvimento infantil, Vygostky no que se refere à concepção da aprendizagem como precursora do desenvolvimento e no trabalho de pesquisadores da arte – educação Brent e Marjorie Wilson ao discutir a importância da apreciação de imagens na aprendizagem do desenho. Como principal instrumento para a coleta de dados, utilizamos o método de exploração crítica que se inscreve numa abordagem piagetiana no âmbito dos estudos processos de aprendizagem: microgêneses.
Linha temática de pesquisa: Psicologia e Educação.
Projeto de Doutorado
Orientadora : Rosa Iavelberg
Sumário
1 -Introdução .................................................. 03
2 - Objeto e Problema da Pesquisa ................06
3- Justificativa ..................................................09
4- Objetivos e Hipóteses....................................13
5- Quadro Teórico.............................................16
6- Fontes, Procedimentos e Etapas ..................17
7- Bibliografia .....................................................19
1 – Introdução
A necessidade desta pesquisa surgiu da vivência de um processo de formação de professores realizado em parceria com a Prefeitura Municipal do Recife nos anos de 2006 e 2007. No desenvolvimento da formação de professores de educação infantil que trabalhavam com grupos de crianças entre cinco e seis anos, a questão do quanto e como a apreciação/fruição das paisagens locais influenciavam a produção dos desenhos foi se delineando como um problema didático que necessitava um estudo específico. Analisando os depoimentos das professoras no diagnóstico realizado para o projeto de formação, percebeu – se que o trabalho com apreciação não era uma prática nas atividades propostas às crianças. Na formação foram incluídas seqüências de atividades de apreciação de imagens da cidade do Recife: atividades com fotos aéreas, desenhos, pinturas de artistas locais e visitas com desenhos de observação de alguns pontos da cidade. A posterior análise dos desenhos e os relatos das professoras apontaram que essas sequências de atividades contribuíram significativamente para um avanço em relação aos desenhos, bem como nas representações do espaço construídas pelas crianças. Contudo, não havia como precisar quais aspectos dessas transformações estavam relacionadas às situações propostas, pois o compromisso era com a capacitação dos professores, num contexto de formação continuada, o que não possibilitou, propor nenhuma investigação ou pesquisa mais aprofundada.
A bibliografia sobre o desenho infantil é vasta, e apresenta diferentes concepções e tendências tanto de pesquisa quanto na relação ensino - aprendizagem. Uma consulta preliminar á essa bibliografia levou a uma delimitação do problema, no sentido de compreender como os aspectos já estudados poderiam dialogar com esta pesquisa.
Podemos dizer que há uma série de transformações das concepções de desenho e da relação ensino – aprendizagem. Sinteticamente, o desenho passa de um ensino referendado no real, na escola tradicional, para uma ação expressiva na escola renovada, desta para um processo psicológico centrado na criança, numa perspectiva ativa/construtivista, para na contemporaneidade ser pensado como uma linguagem á ser construída por uma criança que esta imersa num contexto social que interage e influencia sua produção gráfica.
Entender o desenho como desenho cultivado, segundo Iavelberg(2006:26) “reorienta a visão que se têm das produções infantis, as quais hoje podem ser resignificadas, incluindo os avanços teóricos do ensino da arte e da educação.”
Ainda para essa autora, o desenho cultivado ultrapassa a idéia de estádios, pois compreende que um momento conceitual não é apenas uma determinação do que pode ser aprendido, ele é também uma possibilidade vinculada as experiências vividas, a força da cultura visual e as situações de aprendizagem oferecidas á criança. É nessa perspectiva que o desenho é entendido neste projeto. As pesquisas psicogenéticas de Piaget, em especial na obra A Construção do Real na Criança (1970), trouxeram um novo olhar para a questão da construção da noção do espaço e desta relação com o desenvolvimento do desenho. Nesta obra, a construção do conceito de espaço é uma construção inteligente que retoma o que foi vivido no plano sensório – motor para resignificá-lo internamente, o desenho não é uma fotografia dessa construção. Desenho e espaço são conceitos interdependentes, mas com percursos distintos, sendo necessário dissociar a idéia de que o desenho é uma forma de avaliar a construção desse conceito. Essa é uma discussão importante para a constituição deste projeto, já que a proposta é identificar através de um estudo de campo com de crianças de seis a sete anos como elas representam graficamente seu entorno e quais as contribuições da apreciação das imagens para a ampliação da capacidade de desenhar esse espaço.
Outra contribuição fundamental são os estudos de Vygostky em a Formação Social da Mente (1989) que permitem entender a aprendizagem como precursora do desenvolvimento, e o conceito de “zona de desenvolvimento proximal” que permite pensar na perspectiva das atividades de apreciação como possíveis criadoras de espaços de aprendizagem.
A escolha da faixa etária (seis a sete anos) dessa pesquisa deu- se devido ao tipo de elementos presentes nas suas produções - “cenas ou cenários” e pelas “possibilidades cognitivas” em jogo nesse momento de desenvolvimento. Segundo, Piaget (1978), nessa faixa etária as crianças trabalham com um pensamento intuitivo que assimila e acomoda magicamente as informações. Essa é uma longa construção, que desde os esquemas sensório – motores, coordena, articula, constrói esquemas e estruturas que lhe possibilitarão um pensamento operatório. O pensamento intuitivo, característico dessa faixa etária, coordena imagens visuais, esquemas verbais e caminha rumo a uma lógica operatória em que haverá uma reversibilidade e uma liberação de preconceitos. Este seria, portanto um período interessante para estudar, pois abre a possibilidade de entender como a representação das paisagens se modifica e quais problemas as crianças enfrentam e como as situações de apreciação influenciam esse processo.
Existe também um dialogo com a bibliografia na área de artes visuais ao tratar de temas convergentes para este trabalho, como a ruptura trazida pela contemporaneidade dos conceitos artísticos, as transformações do conceito de paisagem e os estudos interculturais que apontam para o poder das imagens. A documentação e análise do desenho abordada na ótica do trabalho de pesquisadores da arte – educação como Barbosa(2005), Wilson(2005), são também referências importantes para a reflexão sobre a importância da apreciação da imagem nos processos de aprendizagem infantil.
2 - Objeto e Problema da pesquisa
O objeto desta pesquisa se remete a relação entre fatura do desenho e o papel da apreciação de paisagens na construção de representações gráficas no desenho do espaço feitas por crianças de seis a sete anos.
Os estudos sobre o desenho partilham de diferentes contextos históricos, relacionados com a arte produzida em cada período e com as concepções de ensino, aprendizagem e desenvolvimento vigentes. Como já citado na introdução, há uma vasta bibliografia na área tanto de pesquisas em relação ao desenho quanto da construção das noções de representação pela criança, e também na de leitura de imagens. Cada contexto traz uma fundamentação teórica. Entender essas teorias e o que as motivaram ajuda a dimensionar este trabalho, apontando contribuições e críticas.
Do ponto de vista histórico, o desenho foi tratado inicialmente como uma técnica a ser ensinada, cujo produto voltava – se à representação do real. Neste contexto, imperava um ensino tradicional que tinha como meta a imitação, fixação e repetição de modelos, como fruto do processo de aprendizagem. Pensar o desenho com uma representação não era possível, já que o bom desenho era aquele que reproduzia mais fielmente o real.
O nascimento da fotografia e o impacto dos movimentos artísticos: impressionismo, expressionismo, surrealismo, dadaísmo, cubismo, entre outros-, mudaram as possibilidades de ver, fazer e saber arte e isso modificou a concepção de desenho. O desenho não era mais identificado ao real e sim uma das muitas possibilidades de representá-lo. Esta nova forma de entender o desenho estava em sincronia com o pensamento das primeiras décadas do século XX, com as publicações de Piaget e a idéia de que a criança é o pai do homem. Neste período de significativas transformações desenvolvem - se pesquisas voltadas á gênese do processo criativo e dos processos construtivos. Assim conceitos como assimilação, acomodação, erro construtivo, colocavam a criança como centro da aprendizagem, um sujeito que tece hipóteses sobre os objetos para conhecê-los e que tem problemas cognitivos a resolver.
As contribuições de Piaget permitiram compreender o nascimento da função simbólica, a relação da criança com o espaço, o papel do jogo, da linguagem, como se dá o processo de apreensão da realidade e tomada de consciência. Esse mergulho no universo psicológico possibilitou um novo reconhecimento das possibilidades de desenvolvimento das crianças, além de inaugurar uma nova metodologia de pesquisa. O desenho é entendido como forma de expressão uma das capacidades humanas de representação, ação espontânea, voltada para a criação, independente do ensino e da tutela do professor. Os estudos de Luquet( 1969) e Lowenfeld e Brittain(1977) apresentam diferentes fases e uma gênese do desenho. Assim se fundamentam as bases da escola ativa e da concepção de que todos podem criar.
Ao analisar as contribuições de Piaget, Iavelberg(2006:22) declara; “No jogo simbólico, como no desenho, predomina a assimilação deformante das coordenadas dos objetos da realidade ás estruturas da criança – suas coordenadas-, por isso a inteligência representativa é importante tanto na compreensão do real como na edificação do convívio social e da moral da cooperação. “.
Vygotsky dialoga com a obra de Piaget, pontuando uma crítica acerca do lugar da aprendizagem. Para ele, a aprendizagem gera desenvolvimento, para o qual concebe níveis de desenvolvimento: ”.(...) zona de desenvolvimento proximal” “.(...) distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. “ (Vygotsky, 1989:97).
Essa idéia recoloca também o papel do ensino e abre espaço para pensar, no caso deste estudo, do papel do que os alunos vêem em seu contexto social – a apreciação de imagens como possibilidade de “influenciar o desenho de espaço“.
Considerando as capacidades cognitivas das crianças de seis a sete anos como possibilidades de aprendizagem - desenho cultivado de Iavelberg(1995) -, esse projeto busca identificar e analisar o como e quanto a apreciação pode transformar esses desenhos de paisagem.
A opção pela pesquisa com essa faixa – etária visa acompanhar esse processo de transformação e verificar se a apreciação tem alguma influência nesse período do desenvolvimento.
Esse, portanto, é o problema: “Em que medida o trabalho com a apreciação das imagens influencia o desenvolvimento dos esquemas de representações gráficas especialmente em relação á configuração das paisagens no desenho?”
Assim, esse estudo remete a possibilidade de repensar o trabalho nas séries iniciais do Ensino Fundamental inferindo quais as contribuições da apreciação para as aprendizagens das crianças.
3 - Justificativa
Durante o acompanhamento da prática pedagógica dos professores do Recife, observou –se nas crianças a preocupação de “configuração de cenas” em suas produções. Uma hipótese é que isso ocorra porque há uma intenção de estudo das paisagens e de como seus elementos se relacionam. Essa questão é apontada nos estudos e na documentação de vários autores, entre eles LUQUET (1969:22), que afirma que o conjunto de produções gráficas de uma criança, durante um período, tende à predileção por objetos e/ou categorias de desenhos; Lowenfeld e Brittain(1977:155). Lowenfeld falam de uma evolução do conceito de espaço na produção infantil, justificando que, num primeiro momento, a criança concebe o espaço vinculado ao seu corpo e a si mesma, para então transformar esse espaço num “espaço objetal” de relações entre os elementos.
“Os trabalhos artísticos de uma criança, no primeiro nível representativo, mostram um conceito espacial muito diferente do de um adulto. À primeira vista, os objetos, no espaço tendem a estar dispostos numa ordem aleatória. Entretanto, a observação mais detalhada mostrará que a criança concebe o espaço como sendo aquilo que a cerca, isto é os objetos aparecerão acima, abaixo, ou do lado uns dos outros, da forma como a criança os compreende.“ (idem,ibidem). Para esses autores, são as experiências vividas pelo sujeito responsáveis por esse interesse das crianças, mas seria somente uma necessidade interna, que move esse processo. Segundo, Hernandez(2007:22), é preciso uma abordagem que discuta maneiras culturais de olhar e entender a vida e a arte na contemporaneidade, além de uma busca por novas orientações e reflexões a respeito das relações entre arte cotidiano, passado, múltiplas narrativas e construção do significado. O diálogo entre a arte contemporânea e o cotidiano modifica e transforma a leitura dos fazeres e saberes artísticos, os quais são representados socialmente e pela criação de distintas formas de ver que se relacionam com a subjetividade de cada um e a cultura presente. Constituem-se, dessa forma, novos modos de fazer e ver a arte, que se remetem ao passado e ao presente simultaneamente. A apreciação é concebida no contexto da aproximação com a arte que considera a existência de uma cultura visual, entendida como sendo “centrada na imagem visual como o ponto central nos processos, e por meio da qual os significados são produzidos em contextos culturais” (Hernandez 2007:21).
É, portanto, necessário considerar que as experiências de apreciação podem se constituir como uma experiência interna do contexto em que estão inseridas. Isso requer um estudo complexo com interfaces entre os estudos de arte – educação e o entendimento do que seja a arte na contemporaneidade, bem como seu papel na interpretação do espaço. No que se refere a construção de paisagens e sua relação com a apreciação de imagens é preciso compreender que as artes visuais são uma linguagem que articula questões sociais, culturais e afetivas. Esta linguagem está inserida no contexto escolar, ou seja, as escolas de Ensino Fundamental apresentam modelos, imagens, paisagens às crianças e tem proposições de execução de desenhos, que mesmo inconscientemente estão sujeitas a uma determinada concepção e intervenção do professor. Estas proposições propiciam determinados tipos de produção infantil.
A relação arte e ensino é fruto de um contexto histórico com diferentes concepções de arte e do processo de ensino e aprendizagem. Cada concepção traz em si uma determinada prática pedagógica que nem sempre é atualizada e refletida, levando a equívocos quanto à função da leitura de imagens, do fazer e pensar arte para a criança. Segundo Barbosa (1989), que nos fazeres dos professores surgem atividades geradas por equívocos na relação ensino aprendizagem. Há tendências que marcam as artes visuais nas práticas pedagógicas, como: servir de recurso para adquirir habilidades tais como colar, cortar e pintar com limites determinados e aplicar atividades nas quais o trabalho artístico é um meio de fixar conteúdos de outras áreas. Atualmente, impera o trabalho com datas comemorativas, em que as crianças fazem exercícios de pinturas, colagens. Nesta prática é constante a presença de modelos que devem ser copiados e passos a serem seguidos.
Outras vezes, o trabalho com artes é considerado um passatempo, uma atividade sem intencionalidade educativa. É um entretenimento, para o qual não há planejamento nem acompanhamento das produções desenvolvidas pelas crianças. As atividades de desenho e pintura são dirigidas àqueles que já terminaram as lições ou que se encontram sem nenhuma atividade. Seu maior objetivo é o descanso e lazer. Nesses casos, a arte é vista como uma atividade menor, na qual os conteúdos não estão vinculados a área, nem possibilitam uma aprendizagem específica para as crianças. Esse estudo tem a intenção de oferecer mais elementos para a derrocada dessas práticas, na medida em que desvenda um aspecto do processo de aprendizagem do desenho.
No Brasil, em especial, houve uma deformação do trabalho com arte educação, levando a seu empobrecimento e a uma ênfase na interpretação das produções infantis com cunho psicologizante. Nessa concepção, há abandono da criança a sua própria experiência e o deslocamento do trabalho do professor para a cena psicológica, atuação para a qual ele não tem formação, além de não contribuir para o processo de aprendizagem de uma linguagem. Oriunda dos estudos sobre o desenvolvimento infantil nos anos 1970, apesar de propiciar um avanço em relação ao olhar sobre a criança e sua produção, centra as propostas apenas nas experiências perceptuais.
Segundo Iavelberg (2006), as tentativas de inserção da apreciação e do conhecer arte, que nasceram no bojo das críticas à livre- expressa, sofreram uma série de deformações e são, em muitos casos, assimiladas pelos professores como atividades em que obras de artistas são referências para exercícios de reproduções. Assim, mesmo havendo um movimento de inserção das questões da arte no processo de alimentação do fazer, desconsiderou-se o contexto cultural e os saberes das crianças.
Apesar das críticas apontadas por Barbosa (1989), temos enraizamento e mescla de práticas, que ora focalizam a livre expressão ou a reprodução como principais formas de aprendizagem das crianças. A superação desse saber – fazer; reprodução de desenhos estereotipados e das concepções do trabalho de artes visuais como instrumento de fixação de outros conteúdos ainda permanece como um desafio para uma real compreensão da relação entre fruição/produção nas crianças.
Cabe ainda salientar que as pesquisas em didática das artes – visuais demonstram que há um papel relevante da apreciação na construção do desenho. Essas intervenções podem remeter a um repensar sobre o trabalho com esse grupo de crianças, já que existe uma prática usual que trata superficialmente essa relação.
Na bibliografia de arte – educação a inserção da apreciação têm sido um dos principais pilares do ensino. Ferraz e Fusari (1993:44) apresenta a necessidade de ampliação dos saberes dos jovens e crianças focalizando os componentes artísticos: “(...) através da leitura, apreciação, interpretação,e análise mais crítica dessas produções comunicativas.”. Segundo o Referencial Nacional da Educação Infantil(Brasil, 1998), a apreciação em Artes Visuais é um dos eixos da aprendizagem. A leitura e a apreciação de imagens são consideradas fundamentais para o processo de aprendizagem em artes.
Esse projeto, ao propor como instrumento o método de exploração crítico no contexto de um espaço escolar, visa apontar quais as aprendizagens que esses fazeres produzem em relação ao desenho de paisagens e quais são seus limites, contribuindo assim para o aprofundamento da didáticas em artes – visuais.
4 – Objetivos e Hipóteses
O objetivo deste trabalho é identificar as dificuldades enfrentadas no desenho de paisagens e analisar o papel da apreciação para a aprendizagem de novos procedimentos deste tipo de desenho.
A opção por tratar o desenho de paisagem partiu da análise das produções infantis em projetos de formação de professores e no acompanhamento de sua prática pedagógica.
Consideramos que o desenho é composto por códigos e que as crianças estão imersas num ambiente contínuo de “imagens e paisagens”. A hipótese dessa pesquisa é que a apreciação gere necessidade de constituição de esquemas cada vez mais refinados para a linguagem do desenho, ela – apreciação - pode vir a ser uma experiência subjetiva, que permita que as crianças construam um novo esquema para o seu fazer.
Diante disso, as perguntas a serem respondidas são : Qual o papel da apreciação na incorporação de novos esquemas para a produção bidimensional nas crianças de seis a sete anos? A apreciação tem ou não um papel relevante para a produção infantil em relação á representação do espaço? A apreciação permite a criação de novos esquemas para o desenho?
Estamos diante de uma criança inserida num determinado contexto cultural, que lhe oferece uma série de imagens estáticas e em movimento, as quais alimentam suas construções imagéticas. A hipótese é que o trabalho com apreciação desse tipo de imagem permita que a criança se aproprie de esquemas de desenhos, os quais irão constituir um acervo de representações nessa linguagem particular. Assim, se as imagens forem colocadas ao acesso das crianças, elas podem inserir-se em suas produções, dando origem a um desenho cultivado, segundo Iavelberg(2006).
Trata-se de pesquisar a influência dos processos de apreciação por meio da transformação da produção, considerando-os como processos dinâmicos nos quais há constantes re-elaborações entre um e outro conteúdo.
5- Quadro Teórico
Toda pesquisa parte de referências, explícitas ou implícitas, as quais ajudam a contextualizar o problema e a entender sobre que concepções esse trabalho está fundamentado.
Em relação aos estudos e teorias que tratam de uma gênese do processo de aprendizagem do desenho, as bases epistemológicas estão marcadas por uma orientação construtivista, que utiliza a epistemologia genética de Piaget e a escola sócio-histórica de Vygostsky. Um conceito central é o de desenho cultivado, para Iavelberg(2006), o desenho cultivado supera a idéia de uma seqüência de estágios espontâneos e encadeados demarcados numa determinada faixa etária, como aponta Lowenfeld e Brittain (1977). A aprendizagem depende do contexto social e das ações escolares, e está a eles interligada. A análise das produções das crianças de seis e sete anos da escola parte de um mapeamento dos momentos conceituais desse desenho, permitindo entender o caminho das transformações dos desenhos das crianças que são trilhados de níveis de conhecimento menos avançados para níveis mais avançados.
Ver, conhecer e desenhar paisagens permite reflexões sobre as relações entre objetos, entre a criança e seu entorno, entre ele e as outras crianças. Permite também observar limites e refletir sobre as relações do espaço bidimensional. Nesse cenário não podemos dissociar a idéia da construção de uma identidade do sujeito, uma identidade que não se faz isolada do conhecimento sobre as representações do seu entorno e que abre novas percepções para as crianças
Consideramos também os trabalhos desenvolvidos sobre a leitura de imagens e os estudos dos níveis de desenvolvimento da compreensão estética de Housen (1983), para auxiliar na organização das pautas de observação e análises.
No que se refere ás artes visuais, nos referimos à linguagens, com elementos e códigos que podem ser ensinados a um sujeito que aprende e que cria uma poética própria. Sendo assim, o desenho é um objeto de ensino que contém códigos, signos, procedimentos e valores próprios, que necessita estratégias de ensino, a apreciação é uma estratégia que possibilita a ampliação da compreensão das crianças, sobre o desenho. Essa é uma possibilidade de aprendizagem que propõe um dialogo entre as variadas representações humanas e os saberes infantis.
No desenvolvimento da pesquisa, tomamos a idéia de situação – problema e sequências didáticas como a proposição de situações para a criação de um campo propício á análise da relação entre a apreciação e a produção de desenhos de paisagem. As sequências didáticas são: “uma série planejada e orientada de tarefas, com o objetivo de promover uma aprendizagem específica e definida” (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – Brasil,Vol 01,1998:55).
Outra referencia é o conceito de cultura visual tal como o define Hernandez (2007:22). Apreciar é tecer uma rede diversificada de práticas e interpretações críticas da realidade e de suas múltiplas imagens, concebida no contexto da aproximação com as muitas artes produzidas pelo e no cotidiano. A cultura visual é “(...) centrada na imagem visual como o ponto central nos processos, e por meio da qual os significados são produzidos em contextos culturais” (Hernandez 2007:21). Assim, toma – se toda a visualidade presente no contexto local como referência para pensar a seleção de imagens á serem oferecidas às crianças.
No que se refere à pesquisa didática em artes no Brasil, é importante apontar que a experiência com conteúdos específicos, como o proposto neste estudo é recente e tem como fonte inspiradora as construções didáticas realizadas a partir dos anos 1990 em matemática e língua portuguesa, principalmente na concepção de pesquisa didática de Lerner (2002:32). Segundo essa autora existe um sistema de ensino independente de cada professor. Este “sistema” e seus mecanismos de funcionamento precisam ser estudados. Para isso é fundamental ter clareza quanto à diferença entre as práticas sociais reais e os constructos escolares. As práticas escolares, em boa parte dos casos, tendem a uma decupagem dos conteúdos, de forma que estes conteúdos, que são práticas sociais reais, percam sua função. Essa fragmentação não propicia que a criança reconheça esse saber como pertencente ao mundo em que se encontra, alheando o sujeito e deixando nas mãos do professor todo o controle pela aprendizagem.
Trata-se, portando, de um trabalho de diagnóstico e re-conceitualização de saberes e fazeres.
6 – Fontes, Procedimentos e Etapas
A metodologia propõe uma práxis investigativa que se caracteriza por entrevistas e observações nas quais pesquisador e pesquisados interagem na produção de novos conhecimentos. É uma metodologia que vai de encontro ao objetivo da pesquisa. O principal instrumento de coleta de dados é o método de exploração crítica que se caracteriza por uma variação do método clínico, adequado aos estudos de aprendizagem. Pesquisar uma aprendizagem requer tempo, para pesquisar esse processo pretendemos acompanhar, durante 08 meses - equivalente á um ano letivo -, as produções de um grupo de 18 crianças de uma escola de educação infantil na comunidade de Paraisopólis.
A pesquisa prevê o acompanhamento, análise e comparação das produções das crianças, com filmagens das entrevistas. Para a realização de um diagnóstico inicial há uma coleta de 01 de desenho feito espontaneamente pela criança.
Serão realizadas 03 entrevistas com duplas de crianças, num intervalo de 02 meses, nesse intervalo existe a realização de uma sequência de atividades de apreciação composta de três situações de fruição que focalizem uma questão mapeada nas entrevistas individuais.
A entrevista prevê o uso de miniaturas. A proposta é que uma dupla de crianças organizem um espaço interno delimitado ( uma caixa de sapato). Após essa montagem as crianças serão convidadas a desenhar o espaço organizado por elas. Durante a produção dos desenhos a investigadora observa e anota as questões que surgem para a construção de um protocolo de investigação. Momento atual de desenvolvimento da metodologia. A partir da análise desse material será construída uma sequência didática composta por uma coletânea de imagens a serem apreciadas. Cada seqüência é entendida como um contexto de aprendizagem. O trabalho em duplas se justifica pela possibilidade de interação, que é fundamental nos processos de aprendizagem. A realização de uma sequência com três atividades parte da perspectiva de apresentar o problema mapeado através de uma imagem selecionada- tornar observável, rever a questão focalizada apresentando uma solução dada por um artista e a terceira apresentar alternativas de resolução do problema enfrentado.
A proposta é organizar um portfólio com as produções das crianças, seguido de um registro ou planejamento das atividades a serem propostas e sua documentação em DVDs. Os registros dessa documentação são compostos pelos planejamentos, as produções das crianças, filmagens e um registro do pesquisador das produções das crianças. No desenvolvimento da pesquisa, as filmagens e a comparação das produções das crianças visam ao entendimento de como cada um dos elementos presentes no apreciar- fazer se articulam para um avanço nas possibilidades de desenhar das crianças. Para isso, será necessário criar, a partir da coleta das primeiras produções infantis, algumas categorias a serem analisadas e acompanhadas durante o percurso. Tais categorias podem advir de indicadores relativos á construção das noções topológicas: perto/longe, dentro/ fora, continuidade/descontinuidade, semelhança/vizinhança.
Essa idéia permite pensar numa série de atividades que encadeadas abordam o problema sobre diferentes óticas propiciam uma visibilidade para as construções presentes nas relações de ensino e aprendizagem. Uma investigação didática, que focaliza a dupla fruição/produção, suas possibilidades de avanços, bem como a natureza desses avanços.
Nesta perspectiva de pesquisa, a observação participativa do lócus(o local e o cotidiano) permite uma proximidade com o sistema de representação das crianças. A preocupação, neste caso, é observar se os esquemas de desenho presente nas imagens apreciadas são apropriadas pelas crianças e como estas aparecem na produção.
Cronograma
Julho/2010
| Realização das disciplinas | Escrita da introdução da pesquisa Desenvolvimento da metodologia |
Julho/2011 Dezembro/2011 | Realização das disciplinas | Realização do Projeto piloto Elaboração dos protocolos e pautas de observação |
Março/2012 Julho/2012 | Pesquisa | Escrita dos primeiros dados encontrados |
Julho/2012 Dezembro /2012 | Pesquisa | Escrita dos capítulos relativos aos dados encontrados |
Março /2013 | Escrita das conclusões | Finalização |
7 - Bibliografia
ALMEIDA, Rosangela Doin(org), Cartografia Escolar: São Paulo: Contexto, 2007 – Oliveira, Livia, Estudo Metodológico e Cognitivo do Mapa
ANDRÉ, M. E. D. A. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 1995.
_________________. Estudo de caso em pesquisa e avaliação educacional. Brasília: Líber Livro, 2005.
BARBOSA, A. M.(org.). Arte/Educação Contemporânea – Consonâncias Internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.
_________________. Recorte e Colgame. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1989
_________________. (org.). Arte Educação: Leitura no subsolo. 6ª. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
BHABHA, Homi K.. O local da cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Conhecimento de Mundo . Vol 3. Brasília: MEC/SEF, 1998.
FERRAZ; Maria Heloísa C de T.; FUSARI, Maria de F.de Resende. Metodologia de ensino de arte. São Paulo: Cortez, 1993(Coleção Magistério do 2º.grau- Série Formação do Professor)
FRANCO, M. A. S. “Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, v. 31, n. 3, p. 483-502, set./dez. 2005. São Paulo: Universidade Católica de Santos.
HERNÁNDEZ, Fernando, MONTSERRAT, Ventura. A organização do currículo por projetos de trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio. 5ª. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
HERNÀNDEZ, Fernando. Catadores da Cultura Visual . São Paulo: Editora Mediação, 2007.
IAVELBERG, R. Para gostar de aprender artes: sala de aula e formação de professores. Porto Alegre: ARTMED, 2003.
___________ O desenho cultivado da Criança – prática e formação de professores – Porto Alegre:Zouk, 2006.
LERNER, D. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Porto Alegre: Artmed, 2002.
LOWENFELD, Viktor, BRITTAIN, W.L.. Desenvolvimento da capacidade criadora. São Paulo: Editora Mestre Jou,1977.
LUQUET, G.H. O desenho infantil. Porto:Companhia Editora do Minho, 1969.
MACHADO, Silvia D.A.Educação Matemática: uma introdução . São Paulo:EDUC, 1999.
MACEDO, L. Ensaios construtivistas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.
MARTINS, Miriam C., PSICOQUE, Gisa, GUERRA, M. Terezinha, Didática do ensino de arte – a língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD, 1998.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 5ª.ed. São Paulo: Cortez, 2002.
PIAGET, Jean, INHELDER, Bärbel. A Representação do Espaço na Criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
--------------------A Epistemologia Genética: Sabedoria e Ilusões da filosofia; Problemas da psicologia genética – Os Pensadores.São Paulo: Abril Cultural, 1983.
___________ A Construção do Real na Criança. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1970.
___________A Formação do Símbolo na Criança: Imitação, Jogo e Sonho, Imagem e Representação. 3ªed.Rio de Janeiro: Zahar Editores,1978.
SCHON, D. A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
WILSON, Brent; WILSON, Marjorie. Uma visão iconoclasta das fontes de imagens nos desenhos das crianças. Barbosa, Ana Mae(org.) . Arte – Edcuação : Leitura no sub- solo. 6 ed. São Paulo:Cortez, 2005.
VYGOTSKY, Lev.S. A Formação Social da Mente,3ª ed. São Paulo:Martins Fontes,1989.
Sites consultados -
Revista Digital Art& - SNN 1806-2962 – Ano II – número 02- outubro de 2004 - EÇA, Teresa. Perspectivas no ensino das artes visuais.
Grupo Editorial Iberoamericano, 1995. ARTIGUE, M.; MORENO, R.; GOMEZ P. Ingenieria
Didática em Education Matemática. Bogotá:
MACHADO, Silvia D.A . Educação matemática, artigo que gerou o Livro Publicado por Editora da PUC-SP - ISBN 852830373X, 9788528303735 – 1989
Nenhum comentário:
Postar um comentário