Dia 27 de junho de 2011
Disciplina: Leituras de Norbert Elias – Faculdade de Educação - USP
Palestras de Encerramento: Norbert Elias e Sigmund Freud e Norbert Elias e Georg Simmel.
Fala de apresentação da professora Maria da Graça J. Setton:
Caros alunos e colegas
É com imensa satisfação que recebo hoje, dois professores convidados para o encerramento de nosso curso sobre Norbert Elias.
É com sincero contentamento que agradeço a presença do Professor Paulo Endo e o Professor Arthur Bueno, que gentilmente aceitaram estar aqui conosco com o intuito de aprimorar e aprofundar nossas considerações acerca da obra de Norbert Elias.
Gostaria ainda de agradecer a presença de todos, alunos e colegas professores da Fe-USP, que vieram prestigiar esse encontro.
De uma certa forma, estamos aqui desenvolvendo um exercício interdisciplinar tal como Elias nos ensinou.
Estamos promovendo uma reflexão entre dois representantes de áreas do conhecimento muito prezadas por Elias. Ou seja, a psicologia e a sociologia.
Mais do que isso, a participação desses dois colegas se dá em uma disciplina, no universo de discussão da área da Educação, área essa por excelência, interdisciplinar.
Seria bom lembrar que nossos encontros, durante o semestre, tiveram como objetivo maior a consolidação de um entendimento acerca dos processos socializadores a partir de uma perspectiva eliasiana, ou seja, os processos socializadores como um campo de investigação necessariamente que se compõe de indivíduos, estrutura social, sentido e história.
Apropriando-nos da perspectiva metodológica de Elias, aquela que aprendemos ser processual, relacional, de longa duração, interdisciplinar e multidimensional, estamos tendo a oportunidade de por em uso a caixa de ferramentas conceitual de Elias. As leituras realizadas, as discussões promovidas nessas oportunidades partiram sempre da inquietação de fazer desse autor um inspirador nas investigações da área da educação.
Tomando emprestado suas palavras acerca de A. Comte, “Como todos os pensadores Elias construiu a partir daquilo que seus antecessores já tinham produzido. Ninguém começa do nada, todos começam onde outros ficaram. Elias definiu questões de maneira mais clara e que possuem grande significação científica.”
Segundo seu próprio relato, uma certa posição de outsider na família, no exército, na cultura alemã e judaica fizeram com que ele adquirisse uma postura de distanciamento frente aos seus grupos de pertença, o que o auxiliou, a meu ver, em sua perspectiva e amadurecimento sociológico.
Considero que sua condição de nômade, sempre tentando conquistar posições na academia e reconhecimento intelectual acabou também por contribuir para a construção de referências sociológicas e filosóficas ecléticas, abertas e variadas.
Seu pensamento é essencialmente um amálgama entre aportes históricos, sociológicos e psicológicos.
Em síntese, seu nomadismo e desenraizamento acabaram por lhe dar oportunidade de certa originalidade de pensamento e certa liberdade em relação a vínculos institucionais universitários.
Tudo leva a crer que o isolamento acadêmico lhe fez bem.
Na imagem de W. Mills, Elias é um autor que possui muita imaginação sociológica, conseguindo explorá-la de forma invejável.
Como vimos, Elias possuía o talento e a sensibilidade de transformar questões de ordem pessoal em questões de ordem pública e depois, transformá-las em objeto de investigação sociológica.
Para alguns autores Elias é ambíguo, para outros, dialético, para outros ainda, um clássico que a despeito das limitações de sua contribuição, é uma referencia para os estudos sobre a modernidade ocidental e um paradigma acerca das relações indissociáveis entre individuo e sociedade.
Dois eixos de análise que constroem a personalidade intelectual do autor e que fazem dele objeto de nossa atenção.
Poderia afirmar ainda, aproximando-nos das palestras de hoje, que o projeto eliasiano é o cotejo minucioso, sob o terreno da historia, entre os insights das interações entre individuo e sociedade de Simmel e, a teoria do psiquismo humano de Freud, a fim de elaborar uma nova síntese teórica.
A ideia de uma modificação das estruturas da economia psíquica ligada a aquela das estruturas de poder revela essa dupla influencia.
Por um lado, sobre Simmel, raras referencias explícitas nos alertam acerca desse tributo, ainda que saibamos da importância desse clássico na sociologia alemã.
Por outro lado, Elias quer historicizar a construção social e histórica da personalidade psíquica própria das sociedades modernas.
A sociologia figuracional de Elias é atravessada, pois, por essas e outras muitas influencias.
O papel dos estudos figuracionais seria analisar as variações sociais e históricas do psiquismo humano em função das variações dos modelos culturais e societários.
Para Elias a sociologia é uma ciência que precisa se emancipar e romper com uma forma de pensamento metafísico, reificante e ideológico.
Elias, a nosso ver é um artesão do pensamento que consegue articular um amalgama de referencias disciplinares, tendo a oportunidade de construir um pensamento original e heterodoxo, ainda de todo não compreendido.
Sua coragem e atrevimento no campo da criação teórica fizeram com que ele se ocupasse com questões conceituais bastante pertinentes e necessárias, além de nos ensinar que as teorias e seu corpo de conceitos não deveriam ser um instrumental fixo e a-histórico.
A produção do conhecimento é dinâmica, segundo ele, e temos que nos esforçar para encontrar expressões e representações sociais mais próximas à realidade vivida.
Dessa forma, sua nova forma de olhar os fenômenos sociais introduz necessariamente uma critica e uma ruptura com antigos vocabulários, antigos paradigmas que visualizam indivíduos isolados, estruturas institucionais fixas e estáveis; apresenta a força dos enredos coletivos, o equilíbrio de forças entre indivíduos que disputam a sobrevivência social; provoca novos entendimentos sobre o poder de personalidades ou celebridades conduzirem a história; relativiza noções como poder e função com o intuito de explicitar as conexões de sentido do jogo social.
E, sobretudo, nos instrumentaliza para pensar de maneira mais profícua os processos de socialização e de individualização, fenômenos que expressam uma única realidade, ou seja, a construção do social.
É essa riqueza de raciocínio que pretendemos explorar agora a partir das contribuições dos professores Arthur Bueno e Paulo Endo.
Muito obrigada, mais uma vez.
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